O fato da semana certamente foi a repercussão das declarações de um YouTuber brasileiro, Bruno Aiub, vulgo Monark, a favor da criação de um partido nazista no Brasil. Isso aconteceu na segunda-feira, durante transmissão do Flow Podcast, um dos mais ouvidos do país, com 3,6 milhões de seguidores no YouTube e um milhão no Twitch.
Na ocasião, em entrevista com deputados federais, Aiub assim se pronunciou: “Eu acho que tinha que ter um partido nazista reconhecido pela lei”. Por conta disso, Aiub e outros participantes da sinistra entrevista tornaram-se alvo de investigação da Procuradoria Geral da República (PGR) para apurar se houve apologia ao nazismo.
A entrevista causou um verdadeiro clamor entre o público, representantes da comunidade judaica e de instituições (veja box abaixo).
Tudo isso me trouxe à mente a política de extermínio conduzida pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial. É sabido que seis milhões de judeus foram assassinados no que ficou conhecido como Holocausto.
Mas o que talvez você não saiba é que pessoas com deficiência (PCD) também foram alvo deste crime inominável, de uma crueldade sem precedentes em toda a história da Humanidade.
Em um levantamento recente realizado pela Eurordis, 72% das pessoas que dele participaram declararam apresentar dificuldades sensoriais ou motoras, ou seja, eram PCD.
Conheça o Programa T4
Em 14 de julho de 1933, o governo nazista instituiu a “Lei para a Prevenção da Progênie com Doenças Hereditárias”. Essa lei foi um dos primeiros passos dados pelos nazistas em direção ao seu objetivo de criar uma “raça superior” ariana. Ela previa a esterilização de todas as pessoas que sofriam de doenças consideradas hereditárias, como doenças mentais, dificuldades de aprendizagem, deformidade física, epilepsia, cegueira, surdez e alcoolismo grave. Com a aprovação da lei, o Terceiro Reich também intensificou sua propaganda contra as pessoas com deficiência, rotulando-as regularmente de “vidas indignas de serem vividas” ou “comedores inúteis” e destacando “seu fardo para a sociedade”.
O termo “eutanásia” (literalmente, “boa morte”) geralmente se refere à indução de uma morte indolor para um indivíduo com doença crônica ou terminal.
No uso nazista, no entanto, “eutanásia” se referia ao assassinato sistemático de pessoas com deficiências mentais e físicas e institucionalizadas. A operação secreta recebeu o codinome “T4,” em referência ao endereço (Tiergartenstrasse 4) do escritório de coordenação do programa em Berlim. Assim, no outono de 1939, Adolf Hitler autorizou secretamente este programa de “morte por misericórdia”.
Seu Ministério do Interior do Reich circulara um decreto obrigando todos os médicos, enfermeiras e parteiras a relatar recém-nascidos e crianças menores de três anos que apresentassem sinais de deficiência mental ou física grave. No início, apenas bebês e crianças pequenas foram incorporados ao esforço, mas, posteriormente, jovens de até 17 anos de idade também foram mortos. Estimativas conservadoras sugerem que pelo menos 5 mil crianças com deficiência física e mental foram assassinadas por fome ou overdose letal de medicamentos.
*Com informações do Museu do Holocausto
Cifras tenebrosas
Entre 1940 e 1941, aproximadamente 70 mil austríacos e alemães com deficiência foram mortos no programa T4, a maioria por meio de operações de extermínio em grande escala, usando gás venenoso. (Este método serviu como precursor de outros, simplificados, de extermínio empregados na “Solução Final”).
Embora Hitler tenha ordenado formalmente a suspensão do programa no final de agosto de 1941, os assassinatos continuaram secretamente até o fim da guerra, resultando na morte de cerca de 275 mil pessoas com deficiência.
Cinzas de vítimas cremadas foram retiradas de uma pilha comum e colocadas em urnas sem levar em conta a rotulagem precisa. Uma urna foi enviada à família de cada vítima, juntamente com um atestado de óbito com a causa e data da morte fictícias. A morte súbita de milhares de pessoas institucionalizadas, cujos atestados de óbito listavam causas e locais de morte estranhamente semelhantes, levantou suspeitas. Posteriormente, o Programa de Eutanásia já não era mais segredo para ninguém.
*Com informações do Museu do Holocausto
Servidor Público Federal e pesquisador em saúde pública da Fiocruz (Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca). Autor dos blogs “Academia de Pacientes 2030” e “Academia de Pacientes” . Cláudio se interessa pela temática das doenças raras, em uma perspectiva sociológica, bioética e de saúde pública desde 2007. É membro do Grupo de Trabalho em Doenças Raras da Sociedade Brasileira de Pediatria e do grupo Social Pharmaceutical Innovation for Unmet Medical Needs (SPIN)
Saiba mais
Repudie a apologia ao nazismo!
Se você é PCD ou pessoa que vive com doença rara ou seu familiar,
repudie qualquer tentativa de apologia ao nazismo nas redes sociais.
A passividade não é uma opção!